domingo, 28 de outubro de 2007

Um dia passa. E a seguir outro. Desigual. O relógio corre, descansa, volta a correr. E tu és o ponteiro desassossegado que dentro dele vive como se tudo fosse perfeito e o vidro que te separa da realidade nunca se partisse.
Um dia passa. Uma manhã nasce, uma noite morre e ainda há uma estrela que te sorri e que tarda em ir dormir.
É nisto que pensas enquanto fitas o horizonte. E depois tentas juntar palavras, quaisquer palavras, palavras ao acaso e compor um belo texto que irá ser admirado por todos, que te elevará. É isto que queres? Para que servem as palavras que bailam dentro de ti? Para que serve o teu olhar choroso enquanto contemplas a estrela pequenina e pensas em todos os que passaram pela tua vida e que nela ficaram gravados, nos que a preencheram esporadicamente... ?


Vou riscar tudo. Não gosto deste texto. Não é perfeito. Tenho de sentir e criar a minha linguagem.



E num momento tudo se desfez. O meu império de ilusão caiu. O que sou eu sem ele? Carpirei as minhas mágoas. Abraçarei o que resta do meu reinado. Mas afinal quem sou eu? Uma rainha? Rainha de quê? De um condado frágil que se desmorona quando o vento sopra fortemente? Sou rainha de quem e de que gente? Onde estão os meus súbditos?

-Quem és tu, cavaleiro da madrugada?
As perguntas ecoam na minha mente, não há respostas, não há ninguém para responder. Estou só. O meu vestido alvo não emana luz suficiente para reerguer o meu castelo. Jazendo junto aos destroços, apenas me resta a memória e a dor. A perda, a ignorância e compaixão daqueles que passam sem nunca me ter conhecido, sem nunca me ter conhecido, sem nunca me ter olhado. Pedaços de sonhos e desilusão, vestígios da minha glória. Como se o dia fosse perfeito e a noite vil, o meu império se desfez. Porque tudo é efémero e as jóias não são poder. O tesouro real perdeu-se na tempestade do Tempo. Resto eu. "Ficou meu ser que houve, não o que há", diz-me Ele. Reencontro-o em mim, em cada uma das pessoas que vejo e que escuto enquanto as ruínas me dilaceram a alma.
Das ruínas construirei a minha pequena cabana. O ar da montanha agraciárá o meu dia. E continuarei aqui sozinha. Adormecerei na chaise-longue enquanto o sol se põe. E voltarei a ser rainha de mim mesma e guardiã do meu tesouro.

quarta-feira, 17 de outubro de 2007

Eu sou um todo vazio.
Sou um corpo e uma alma.
Mas, principalmente, sou uma alma espelhada num corpo.
Através dos olhos, do olhar.

As lágrimas caem enquanto a mão torturada escreve,
Enquanto sigo um rumo desconhecido e não encontro
Paz ou sequer um mero transeunte que me possa ensinar
O trilho certo.

Faço planos que não sei o que são, construo sonhos sempre.
E desisto. E quase apago o olhar.
E assim o tempo corre devagar, passando por mim, intemporal.

E assim sinto o peso dos segundos, o relógio imponente que rege o que sou.
Não sei para onde vou. Sou uma torre de marfim fechada, maravilhosa.
Quem me esculpiu perdeu o molde, perdeu a precisão no gesto.

E no meio da multidão grito por socorro silenciosamente.
Muitos me olham, fingem entender.
Sou um tudo que não é nada.
Sou um pedaço de alma perdido no vazio dos corações.