quarta-feira, 28 de janeiro de 2009

Quis pegar no lápis, na caneta, na pena.
Quis ir buscar um papel vazio
Desejando atirar as minhas palavras ao acaso.
Quis pegar num caderno e arrancar todas as folhas,
Rasgá-las uma, duas, três vezes.

Quis pegar num livro e arrancar-lhe as histórias.
Já quis apenas querer.
Não tive coragem de destruir palavras nem de rasgar as folhas.

Hoje quero pegar numa pedra, atirá-la ao chão e parti-la em mil pedaços
Apenas com um gesto brusco.
Mas a minha mão já não tem forças,
Os meus olhos já não tem lágrimas para chorar a perda.

Fiquei à chuva com uma pedra entre as mãos.
Agarrei-a como nunca agarrei a minha vida.
E passaram-se horas, dias.
Vi o sol nascer e dormir todos os dias,
Vi a lua a sorrir e pontinhos brilhantes lá em cima.

Mas nada teve significado. Despertei apenas quando a pedra
Desapareceu das minhas mãos. Finalmente movi o meu corpo
E senti um pedregulho cinzento, ferido e frágil no lugar de coração.

domingo, 18 de janeiro de 2009

Corpo

Sinto-me fraca e cansada.
Por não dormir. Por ter saído da cama porque senti frio.
Porque afinal o meu corpo lutou contra a minha mente
Todo o dia. Só fez uma pausa quando adormeci no sofá,
Morta de dor.

Mas em breve despertei porque a sala estava quente
E eu cheia de frio. Não sei quantas camisolas e agasalhos tinha.
Só sei que passei o dia cheia de frio.

A noite está a começar agora e já começo a ter frio.
Posso ter tomado dez ou vinte cafés que o efeito é contrário.
Tudo por causa do meu corpo contraído e fraco que não se alimentou
Do meu coração. Porque ele parou como pára um relógio numa hora
E num segundo qualquer.

Só não anotei a hora por causa do tic-tac do relógio.
Não gosto deles. Uso-os apenas quando o tempo está parado
E não me incomodam com aquele barulho constante.

O meu corpo quer fraquejar agora, mas não deixo.
Foi espancado até eu perder os sentidos e perder a alma
Numa rua que conheço. Mas arrastei-o pela cidade.
E ficou bem.

Só não sei onde perdi o coração.
Um dia vais acordar de manhãzinha e abrir a janela do quarto para ver o sol nascer. Já não o fazes há muito tempo. Os dias correram e atropelaram-se uns aos outros em silêncio. Sem gritos e com algumas lágrimas que se perderam por entre os milhões de passos que deste procurando o infinito. Mas um dia, logo de manhãzinha, irás até à janela. Uma qualquer para ver que o sol já não nasce. E pensarás, assustado, que te fugiu por entre os dedos escorregando num momento em que um coração parou, enregelado de dor. E nesse dia a tua lágrima cairá, sofrida e sem fim, no chão do teu quarto, que estará frio, insensível, livre de ti. No dia em que reparares que o sol que te aquecia todas as manhãs e de ti se despedia com um beijo suave e com a promessa de um breve regresso fugiu de ti, da tua crueldade, do teu coração de pedra, a tua lágrima cairá. Deixou de arder lentamente quando te deslumbraste com a imagem de um quadro. Era apenas amarelo e tu deixaste-te enfeitiçar por aquele sol fingido, pronto para te usar e para te deitar fora. E esqueceste o sol que do outro lado brilhava. Mas teimaste em fechar as cortinas e entristeceste-o. Ficou dias sozinho, sentindo-te do outro lado encantado, usado, e o próprio raio queimou-o. O teu gesto rude, a janela que fechaste... Oxalá tivesses apenas fechado a janela do teu quarto. Correste a casa depressa, descalço, não te importando com os cacos que reluziam na escadaria. Feriste-te e não te doeu porque já nem conseguias sentir. Voltaste a correr. Fechaste todas as janelas e isolaste-te no teu palácio sentindo-te um Imperador. E o sol continuou cá fora. Só. Sem ti. Espreitava para te tentar ver nem que fosse de longe apenas para te dizer que o brilho se apagara. E tu nunca o deixaste entrar na tua casa, na tua vida, dentro de ti.
Um dia reparaste que fugiu... Enfraquecido, cansado devido a uma espera que imaginava infindável, apenas partiu. E aí voltaste a abrir a janela. E a chamar o sol incessantemente, buscando ternura e conforto. Fartaste-te do teu sol falso. Mas não te lembraste do que deixaste cá fora. Não te lembraste da dor que causaste, do ciúme, do desalento. E não o encontraste.

quinta-feira, 15 de janeiro de 2009

Reviver o passado

Julgava eu que o choro convulsivo, magoado me tinha abandonado de vez. Não, estava apenas disfarçado de indiferença. E hoje senti o grito dolorido e sufocado. A voz que falha e o chão que nos acolhe. Senti os olhos a arder. O corpo sem forças. As lágrimas a cair e a acariciar o meu rosto queimando-o como já há muito não faziam, lembrando-o da densidade dos gestos, de palavras que ferem e ainda mais das que não foram ditas, das que trariam sorrisos e me fariam repousar serenamente.
Não. A dor voltou. Talvez porque eu própria tenha parado de fingir para mim mesma, porque tenha medo sem máscara, exposta e pura, apesar de todos pensarem que tudo em mim é falso quando, na verdade, estou despida à frente de todos, sofrendo em silêncio e sabendo qual será o final da história. Afinal chegou mais tarde do que o que eu previa: o choro e o chão gelado acolhendo a escuridão.
Por que me dói o coração se repudiei o amor?
Se me afastei para não sofrer, se o atirei para um canto
E o esqueci como se esquece o Inverno das folhas que o Outono
Arrancou violentamente das árvores e as fez cair no chão desamparadas,
mortas de tudo ou de nada, se é que algum dia tiveram vida...

Se o guardei no fundo do peito bem fechado para que irrompesse
Sagaz, louco para me castigar...
Se o pus de lado pensando que ele jamais voltaria a acolher-me
Nos seus braços delicados e insidiosos.

Se afastei a volúpia de sentimentos...
Se os reneguei quando o corpo caiu no chão frio e duro
Amparando o meu grito e toda a dor que se escondeu
Na minha pele disfarçada de desejo,
Amparando o meu choro triste, os olhos tristes que apenas entreabrem
Sem se preocuparem em ver porque afinal está escuro e já não há dia.

quarta-feira, 14 de janeiro de 2009

O Amor dói. O Amor dói e enfraquece.
O Amor é o Amor. Por ser Amor simplesmente dói.

Um dia pensei poder fugir do Amor.
Mas o Amor perseguiu-me sagazmente até me aprisionar
Num tempo qualquer num espaço qualquer.
Eu e o Amor escondidos por aí; amantes traiçoeiros.

Mas Eros descobriu o meu cativeiro e quando me possuiu violentamente
A minha vida acabou.
Eros divino acorrentou-me e acendeu uma fogueira naquela sala.´
Só consigo distinguir sombras, mas não as reconheço.
Presa horas a fio, o pensamento foge, o corpo fraqueja, dorido, preso,
Em carne viva.

E há feridas que não cicatrizam e o calor aumenta a dor.
Oiço os meus gritos, mas não tenho voz. Não podem ser meus.
Lutei até não ter forças, até não poder falar, sentir.

Mas o poderoso Eros num rasgo de loucura apagou a fogueira
E restei eu. Em silêncio e esquecida entre aquelas paredes.
Naquele tempo foi como se estivesse na sombra
Durante todas as horas. E via reflexos de luz aqui e ali.
E, de repente, vislumbrei que não estava sozinha.
Havia alguém naquele quarto, naquela cave, naquele sítio
Que não sei onde é, naquela data que não reconheço.

Senti um homem perto de mim. Olhava-me sempre fingido
Esperando que o cansaço me derrubasse para me poder cravar
Um punhal repleto de pedras preciosas no peito sem me matar,
Ferindo-me, cortando-me vezes sem conta, tentando purificar-se
No meu sangue que gota a gota ia caindo no chão enquanto os meus olhos se fechavam
Lentamente.
E ele esperou que nem mais uma gota caísse e uma gargalhada ali ecoou.