Agora que as mãos cálidas
arrefeceram
e um sopro de noite
estupra
a janela, que resta perguntar?
Não há voz dorida e
des-pe-da-ça-da-men-te
enjaulada
que se atreva a dar
uma entoação
de ponto de interrogação.
Não resta perguntar
nada
só silêncio
ao fundo do quarto
pergunta e responde,
nurmurando,
gemendo,
bramindo impropérios
em voz-off.
Agora que o frio invadiu a janela do teu
quarto,
meu
amor,
resta-te o vidro escrupulosamente
cortado
e uma cama
desfeita.
quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011
terça-feira, 22 de fevereiro de 2011
Do Gosto
A pele na pele.
O mel
que escorre
pelas pernas
lânguidas
longas
frementes.
A pele na boca
da pele.
Nua e fria.
Sem aroma.
Língua sem sabor
que passar pela
perna
longa
lânguida
desenhada
sem
mel.
(queimada)
Pele sem pele.
O mel
que escorre
pelas pernas
lânguidas
longas
frementes.
A pele na boca
da pele.
Nua e fria.
Sem aroma.
Língua sem sabor
que passar pela
perna
longa
lânguida
desenhada
sem
mel.
(queimada)
Pele sem pele.
Tenho-te na memória dos dedos, nos risquinhos quase imperceptíveis dos lábios.
A minha boca palpitante, com o coração entalado no esófago.
Como esquecer a minha própria impressão digital?
Um amor de sofá emprestado e murmúrios na pele.
Tenho-te na memória dos meus-teus-olhos perpassados pela
sombra.
Sempre gostei da sombra dos teus olhos,
aquela que vi passar quando me deste o beijo mais
seco
áspero
recusado
que uma boca pode dar a outra.
Foi nesse momento que mastiguei o coração,
que o sorvi de um trago
e o coloquei de volta lá
naquele sítio a que chamam peito.
Continua a ter duas aurículas
e dos ventr(e)ículos.
Ou talvez pedaços mastigados
de prazer
e de um cinzento corroído.
Nunca quis que me visses por dentro.
Não.
Ou talvez um sadismo fremente
quisesse que a tua digital
me timbrasse a carne
como uma tatuagem
que não cicatriza.
Desenhada e aberta.
A minha boca palpitante, com o coração entalado no esófago.
Como esquecer a minha própria impressão digital?
Um amor de sofá emprestado e murmúrios na pele.
Tenho-te na memória dos meus-teus-olhos perpassados pela
sombra.
Sempre gostei da sombra dos teus olhos,
aquela que vi passar quando me deste o beijo mais
seco
áspero
recusado
que uma boca pode dar a outra.
Foi nesse momento que mastiguei o coração,
que o sorvi de um trago
e o coloquei de volta lá
naquele sítio a que chamam peito.
Continua a ter duas aurículas
e dos ventr(e)ículos.
Ou talvez pedaços mastigados
de prazer
e de um cinzento corroído.
Nunca quis que me visses por dentro.
Não.
Ou talvez um sadismo fremente
quisesse que a tua digital
me timbrasse a carne
como uma tatuagem
que não cicatriza.
Desenhada e aberta.
quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011
Gata
Tinha olhos de gata no cio. Profundos, densos, sorridentes. A boca sedenta, os dedos esguios. Tinha olhos de gata. No cio. Brilhantes, esquizofrénicos, inquietos. Passeava pela rua de fato decente, gabardine composta. O cabelo meticulosamente alinhado e um conjunto de pulseiras que tilintava quando o salto pisava o chão inebriado. Gostava de passear pelas ruas de óculos de sol e esconder os olhos. De gata. No cio. De carregar a carteira na mão e balançar as ancas. Observar os olhos de quem a via passar. Olhos no cio. De gata escondida. Escondidos. Poucas palavras saíam da sua boca voraz. Pouquíssimas. Saíam-lhe sim como faíscas. Dos olhos. Observava os gestos das pessoas que não conhecia, que se cruzavam com ela nas lojas, no supermercado, na rua, no café, nos jardins. O dente a morder o lábio, os lábios contraídos. A mão inquieta no cabelo, um sorriso disfarçado. Lolita. Fingia enterrar os olhos e a alma nas palavras de Nabokov. Para olhar sem pudor. Para sentir prazer num voyeurismo inconsciente. Espiar os casais do parque. O beijo de olhos abertos, a mão travada a caminho da blusa. E ficava ali horas a fio no banco de jardim a imaginar-se nos braços daqueles homens, todos eles diferentes, renovando-se à passagem das horas. Os seus olhos de gata a faiscar, as mãos numas quaisquer calças. Puta. No cio.
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