domingo, 8 de março de 2009

Essa coisa, a paixão

Era bom que pudéssemos ir ao supermercado e pedir meio quilo de paixão; deve durar para o mês todo. Ou se calhar não. Mas também havia a hipótese de podermos regressar à superfície comercial e comprar mais. Só para abastecer o stock. Para o caso de acontecer algum imprevisto, tal como uma inundação, ou uma fuga de paixão, ou ainda um incêndio. No primeiro caso, estragava-se, secava e talvez ainda desse para usar a dita...paixão; no segundo, perda irremediável, pois seguir-se-ia uma explosão, um incêndio (o terceiro), muito fogo e queimaduras na pele. Se calhar também no coração, mas tenho as minhas dúvidas. Então, aviados de um quilo ou mais de paixão, felizes e contentes, regressamos a casa e começamos a consumi-la lentamente no dia-a-dia e ardentemente nos dias de ímpeto.
Mas (e infelizmente há sempre um!), ainda não descobri em que prateleira se escondeu a malvada! Se calhar não procurei bem entre as prateleiras das guloseimas e dos chocolates. Ou se calhar encaixou-se no corredor do vinho. A verdade é que não perdi muito tempo. Fiz as compras que tinha a fazer, paguei e pus os sacos no carro para arrancar a grande velocidade. Apesar de não ter descoberto a dita, desconfio que afinal não se pode comprar e muito menos num supermercado.
Essa coisa, a paixão, vem de repente e é mal educada. Não pede permissão para entrar nas nossas vidas, instala-se no nosso quarto, na nossa cama, usa a nossa roupa, abre-nos as gavetas e encontra os tesouros que temos escondidos. Escreve com a nossa mão no nosso diário. Mais, usa o nosso corpo, o nosso perfume preferido, calça todos os dias os nossos sapatos, mesmo quando são de salto fino e alto e fazem doer a alma. Instala-se porque sim. Ou porque não. O facto é que se instala e se apodera de nós.
Essa coisa, a paixão, que, soube agora que não se vende mesmo nos hipermercados; essa, a mal encarada, a que não pede licença, essa afinal até nos adormece quando o sono não vem, fazendo promessas de um dia melhor, lançando no ar a hipótese de um olhar, de um beijo escondido, de uma carícia trocada sem querer.
Mas essa coisa, a paixão, também pode causar dano (se ela realmente se vendesse, os senhores diriam que passou de prazo). E, continuando com esta gíria, quando isso acontece, reclamamos com quem, com o quê? Vamos a uma espécie de DECO apresentar uma reclamação? Escrevemos no próprio livro das superfícies comerciais? Exigimos o quê de volta? A quem?
Essa, coisa, a paixão, é pena que não se possa deitar fora e esquecê-la no fundo de um saco de plástico que os senhores do lixo recolhem, por cá, às quartas-feiras e domingos.
Bandida! Quando é apanhada em flagrante, faz uma expressão inocente. Descarta-se das culpas todas e diz que vai ficar sossegada e que não vai voltar a mexer nos corações ingénuos de novo. Mas não, é uma criança com a sede de mexer no proibido, de se sujar na terra, de correr o dia todo sem se cansar, de se lambuzar de chocolates, de dar uma risada e limpar as mãos à camisola branca que só assim ficou porque esteve dias na lixívia.
Essa coisa, a paixão.

2 comentários:

Vânia disse...

A paixao... qd é pelas pessoas erradas é para esquecer.
É dar lhes 2 trutas nas beiças e já esta! xD *

Dr. Love disse...

A paixão é como uma sopa que com o passar do tempo vai ficando fria e perde o seu sabor…por isso é que mudamos de refeição com frequência até encontrar a nossa ambrósia (manjar dos deuses) mas a maioria das pessoas não chega lá e tem de se contentar com um happy meal!